El amor es dar lo que no se tiene a alguien que no es.
Jacques Lacan
O evento estético é algo tão evidente, tão imediato, tão indefinível como o amor, o sabor da fruta, da água.
quinta-feira, 24 de setembro de 2015
quinta-feira, 17 de setembro de 2015
A minha mãe não me deixa ter um coelho - Brian Patten
A minha mãe não me deixa ter um coelho
Nem que seja um coelho-anão
Não me deixa ter um hamster
Um porco-espinho ou um cão
Não posso ter pombos-correio
Muito menos um rouxinol
Não posso ter um melro
Nem um simples caracol
Não me deixa ter uma cascavel
Ou uma víbora debaixo da cama
Não me deixa ter uma gibóia
Um camelo ou um lama
Não me deixa ter um urso
E não sei por que é que se riu de mim
Quando lhe disse que queria ter uma iguana
Um mangusto ou um pangolim
Não posso ter uma barata
Muito menos um sardão
Não posso ter uma bicha-cadela
Um gusano ou um furão
Não posso ter um gnu
E isto só me acontece a mim
Não posso ter um tatu
Um panda ou um pinguim
Não me deixa ter piranhas
E o que me faz mais pena
É que não me deixe ter um morcego
Um mabeco ou uma hiena
Por isso tenho uma formiga de estimação
No jardim e lá ao fundo na arrecadação
Escondido por detrás da estante
Um secreto elefante
(in Poemas com Asas; poema transposto por Jorge Sousa Braga)
Nem que seja um coelho-anão
Não me deixa ter um hamster
Um porco-espinho ou um cão
Não posso ter pombos-correio
Muito menos um rouxinol
Não posso ter um melro
Nem um simples caracol
Não me deixa ter uma cascavel
Ou uma víbora debaixo da cama
Não me deixa ter uma gibóia
Um camelo ou um lama
Não me deixa ter um urso
E não sei por que é que se riu de mim
Quando lhe disse que queria ter uma iguana
Um mangusto ou um pangolim
Não posso ter uma barata
Muito menos um sardão
Não posso ter uma bicha-cadela
Um gusano ou um furão
Não posso ter um gnu
E isto só me acontece a mim
Não posso ter um tatu
Um panda ou um pinguim
Não me deixa ter piranhas
E o que me faz mais pena
É que não me deixe ter um morcego
Um mabeco ou uma hiena
Por isso tenho uma formiga de estimação
No jardim e lá ao fundo na arrecadação
Escondido por detrás da estante
Um secreto elefante
(in Poemas com Asas; poema transposto por Jorge Sousa Braga)
sábado, 8 de agosto de 2015
Música de anónimo do século XVII - José Manuel Teixeira da Silva
Recebe a música de cada vez anónima
nos dedos que fogem e duram fulminantes
ou descansam de leve no instrumento etéreo
que chegou de um século seguinte
A vastidão do dia afina-se no embalo das vidas
são correntes de um ar que nos transporta
repercutido silêncio exposto
mas só agora plenamente alheio
nos dedos que fogem e duram fulminantes
ou descansam de leve no instrumento etéreo
que chegou de um século seguinte
A vastidão do dia afina-se no embalo das vidas
são correntes de um ar que nos transporta
repercutido silêncio exposto
mas só agora plenamente alheio
sexta-feira, 24 de julho de 2015
Sobre a perfeição dos textos - Bernardo Soares
Sobre a perfeição dos textos:
"Sabemos bem que toda a obra tem que ser imperfeita, e que a menos segura das nossas contemplações estheticas será a de aquillo que escrevemos. Mas imperfeito é tudo, nem ha poente tam bello que o não pudesse ser mais, ou brisa leve que nos dê somno que não pudesse dar-nos um somno mais calmo ainda. E assim, contempladores eguaes das montanhas e das estatuas, gosando os dias como os livros, sonhando tudo, sobretudo, para o converter na nossa intima substancia, faremos tambem descripções e analyses, que, uma vez feitas, passarão a ser coisas alheias, que podemos gosar como se viessem na tarde."
Bernardo Soares, Livro do Desassossego.
"Sabemos bem que toda a obra tem que ser imperfeita, e que a menos segura das nossas contemplações estheticas será a de aquillo que escrevemos. Mas imperfeito é tudo, nem ha poente tam bello que o não pudesse ser mais, ou brisa leve que nos dê somno que não pudesse dar-nos um somno mais calmo ainda. E assim, contempladores eguaes das montanhas e das estatuas, gosando os dias como os livros, sonhando tudo, sobretudo, para o converter na nossa intima substancia, faremos tambem descripções e analyses, que, uma vez feitas, passarão a ser coisas alheias, que podemos gosar como se viessem na tarde."
Bernardo Soares, Livro do Desassossego.
Poema sobre o começo do poema de J. C. de Melo Neto chamado Poema - Jorge de Sena
A tinta e a lápis
escrevem-se / são escritos
todos os versos do mundo / quase todos os versos do mundo
À máquina
escrevem-se / são escritos
alguns dos versos do mundo
Com sangue (diz-se)
escrevem-se / são escritos
uns pouquíssimos
E consta que já outros foram escritos
com outros materiais excretos.
escrevem-se / são escritos
todos os versos do mundo / quase todos os versos do mundo
À máquina
escrevem-se / são escritos
alguns dos versos do mundo
Com sangue (diz-se)
escrevem-se / são escritos
uns pouquíssimos
E consta que já outros foram escritos
com outros materiais excretos.
Inocência - Jorge de Sena
No pórtico da casa, entre os lilases, o par de namorados brincava de apertar-se as mãos e de contar os dedos. Havia sempre um dedo a mais.
terça-feira, 9 de junho de 2015
Quem me quiser
Quem me quiser há-de saber as conchas
a cantigas dos búzios e do mar.
Quem me quiser há-de saber as ondas
e a verde tentação de naufragar.
Quem me quiser há-de saber as fontes,
a laranjeira em flor, a cor do feno,
à saudade lilás que há nos poentes,
o cheiro de maçãs que há no inverno.
Quem me quiser há-de saber a chuva
que põe colares de pérolas nos ombros
há-de saber os beijos e as uvas
há-de saber as asas e os pombos.
Quem me quiser há-de saber os medos
que passam nos abismos infinitos
a nudez clamorosa dos meus dedos
o salmo penitente dos meus gritos.
Quem me quiser há-de saber a espuma
em que sou turbilhão, subitamente
– Ou então não saber a coisa nenhuma
e embalar-me ao peito, simplesmente.
Rosa Lobato de Faria
terça-feira, 24 de março de 2015
Este amor pelas coisas quotidianas
Este amor pelas coisas quotidianas,
Em parte intrínseco ao grande olhar da infância,
Em parte um cálculo literário,
Estaremos apenas a evitar o nosso único e verdadeiro destino
Quando fazemos isso, desviando o nosso olhar
De Philip Larkin que espera por nós com um casaco de coveiro?
Os ramos despidos contra o céu
Não vão salvar salvar ninguém do vazio que os envolve,
nem o açucareiro ou a colher de açúcar em cima da mesa.
Então para quê preocuparmo-nos com o farol axadrezado?
Para quê perder tempo com o pardal,
Ou as flores selvagens ao longo da estrada
Quando todos devíamos estar sozinhos nos nossos quartos
A atirarmo-nos contra a parede da vida
E a parede oposta da morte,
Com a porta trancada atrás de nós
Enquanto arremessarmos pedras contra a questão do sentido
E o mistério das nossas origens?
Para que serve o pirilampo,
A gota deslizando ao longo da folha verde,
ou até o sabonete escorregando em volta da banheira
Quando devíamos realmente estar
A bater tão forte quando podemos no mistério
E os vizinhos que se danem?
O bater sem parar no próprio Nada,
Alguns com as testas,
Outros com o malho dos sentidos, o queixo levantado da poesia.
Billy Collins
Em parte intrínseco ao grande olhar da infância,
Em parte um cálculo literário,
Estaremos apenas a evitar o nosso único e verdadeiro destino
Quando fazemos isso, desviando o nosso olhar
De Philip Larkin que espera por nós com um casaco de coveiro?
Os ramos despidos contra o céu
Não vão salvar salvar ninguém do vazio que os envolve,
nem o açucareiro ou a colher de açúcar em cima da mesa.
Então para quê preocuparmo-nos com o farol axadrezado?
Para quê perder tempo com o pardal,
Ou as flores selvagens ao longo da estrada
Quando todos devíamos estar sozinhos nos nossos quartos
A atirarmo-nos contra a parede da vida
E a parede oposta da morte,
Com a porta trancada atrás de nós
Enquanto arremessarmos pedras contra a questão do sentido
E o mistério das nossas origens?
Para que serve o pirilampo,
A gota deslizando ao longo da folha verde,
ou até o sabonete escorregando em volta da banheira
Quando devíamos realmente estar
A bater tão forte quando podemos no mistério
E os vizinhos que se danem?
O bater sem parar no próprio Nada,
Alguns com as testas,
Outros com o malho dos sentidos, o queixo levantado da poesia.
Billy Collins
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